Na contramão dos Top 100, os micro e pequenos produtores de leite sofreram mais duramente o impacto da alta das importações de lácteos nos preços da matéria-prima. Não há estatística oficial, mas fontes do setor relatam aumento no número de produtores que desistiram da atividade. Dados mais recentes do censo agropecuário, de 2017, revelam que o número de produtores de leite no país, que já foi de 1,35 milhão em 2010, caiu para 1,17 milhão.

Eduardo Siqueira, dono da Fazenda Bom Sucesso, em Itanhandu, no sul de Minas Gerais, está em uma família que produz leite há mais de cem anos. Ele mesmo dedicou-se à atividade por 22 anos, mas, em janeiro, desistiu.

“Vendi meu gado e fiz o arrendamento da parte de confinamento e ordenha”, diz. A fazenda tinha 200 cabeças de gado, sendo 90 vacas em produção e gado de corte. Produzia 2,4 mil litros de leite por dia. Parte era vendida a um laticínio, e outra, usada na produção própria de queijos artesanais.

“Eu nunca vi uma crise igual a essa. Leite vendido a R$ 1,90, R$ 2,00, a conta não fecha. Tenho alguns tios pensando em parar também”, relata. Siqueira diz que usou o dinheiro da venda das 90 vacas para comprar gado de corte. Vai continuar produzindo queijo, mas vai comprar o leite.

Outro que desistiu foi João Paulo Macedo, de Carvalhópolis, no sul de Minas Gerais. Depois de produzir leite por 15 anos, o pecuarista deixou a atividade no mês passado. Macedo tinha 50 cabeças de gado, sendo dez bezerras em lactação. Captava de 400 a 500 litros por dia. “Tive que demitir um funcionário e passei a trabalhar sozinho, mas mesmo assim tirava do bolso todo mês para pagar as contas. Até para sair da atividade está difícil porque ninguém quer comprar”, afirma.

O produtor trocou as dez vacas por gado de corte e pensa em vender outras dez bezerras que ainda possui. “Comecei a trabalhar como autônomo com trator para sobreviver. O gado que tenho vai demorar uns dois anos ainda para ir para abate”, diz Macedo.

A Cooperativa Central de Produtores Rurais (CCPR), que reúne 31 cooperativas em Minas Gerais e Goiás e cerca de 25 mil cooperados, viu de perto os impactos da queda nos preços do leite em produções de todos os portes. No ano passado, 163 cooperados saíram da pecuária leiteira, totalizando um volume captado médio de 36,5 mil litros, ou 1,5% do volume diário captado pela CCPR.

“O custo de produção ficou entre R$ 1,80 e R$ 2,25 por litro, dependendo da região. Com o preço do leite a R$ 2 por litro, parte dos produtores ficou sem estímulo para produzir”, afirma o presidente Marcelo Candiotto.

A CCPR fechou o ano passado com uma captação média de 2,4 milhões de litros de leite por dia, e trabalha para expandir a sua bacia leiteira. Para isso, investiu R$ 240 milhões em uma fábrica de ração em Curvelo (MG), que começa a operar em junho deste ano. Com a fábrica, vai ampliar a capacidade de produção de ração para gado de 300 mil toneladas por ano para 1,2 milhão de toneladas. “Em 2024 vamos produzir mais ração para captar mais leite e ampliar nossa bacia leiteira”, diz Candiotto.

A cooperativa também busca diversificação e está investindo em pecuária de corte, com confinamento de animais de cooperados em fazendas parceiras.

Fonte: Globo Rural