A Justiça Federal em Mato Grosso determinou ao Instituto de Defesa Agropecuária do Estado (Indea-MT) o compartilhamento de informações detalhadas sobre as Guias de Trânsito Animal (GTA) de pecuaristas mato-grossenses com o Ministério Público Federal (MPF) e outros órgãos de controle no prazo de 60 dias. Os dados serão usados para checar a origem e a legalidade ambiental do gado que vai para abate nos frigoríficos da região.

A decisão liminar atendeu a um pedido do MPF para ter acesso facilitado e atualizado, por meio virtual, aos dados das GTAs. O órgão pediu transparência nas informações ambientais. A determinação prevê a disponibilização de número, data de emissão, volume transportado, procedência e destino (CPF/CNPJ completos, nome, estabelecimento, município), idade, finalidade, unidade expedidora, observações eventuais. O Indea-MT apresentou recurso em segunda instância contra a decisão.

O compartilhamento, segundo a liminar, deverá ser feito por meio de listagem e do extrato das guias na íntegra. O Indea-MT também precisará disponibilizar as informações de forma automática e atualizada periodicamente daqui em diante.

Mato Grosso tem o maior rebanho bovino do país, com 34,1 milhões de cabeças de gado, de acordo com o instituto. A criação é feita em 109.751 estabelecimentos rurais do Estado.

A decisão, assinada pelo juiz Diogo Negrisoli Oliveira, da 8ª Vara Federal Cível de Mato Grosso, relata que o MPF já havia solicitado tais informações, mas que o Indea-MT alegou restrição de informações ao público em geral nas GTAs, como dados protegidos por lei, como CPF e CNPJ. Integrantes do Ministério da Agricultura também defendem que o documento tem viés apenas sanitário, não ambiental.

O tema é debatido em torno das propostas para implementação de nova rastreabilidade animal no país e também para o atendimento às novas exigências da lei antidesmatamento da União Europeia. Não há consenso sobre o compartilhamento dos dados das GTAs

Nos autos do processo, o MPF diz que “os dados não só não estão protegidos por sigilo legalmente estabelecido, nem representando dados pessoais de indivíduos, como são informações relevantes para o conhecimento público em geral, que deveriam ser divulgados amplamente para a sociedade”.

Decisão semelhante já havia sido tomada no ano passado para determinar o compartilhamento das GTAs do Amazonas, Rondônia e Acre. A finalidade é a mesma: atender necessidades para acompanhamento do Projeto Carne Legal, referente aos Termos de Ajustamento de Conduta (TACs) firmados com MPF para a verificação da regularidade da cadeia de produção de proteína animal na Amazônia Legal, para garantir que os produtos não sejam oriundos de áreas alvo de desmatamentos ilegais.

O MPF defende que “as guias de trânsito animal e demais atos e informações sanitárias, para além de sua função eminentemente sanitária, cumprem também uma função ambiental na Amazônia Legal”. O órgão afirma que a pecuária é um “grande vetor de expansão do desmatamento no bioma” e que o controle da atividade econômica, mediante a identificação de áreas desmatadas onde ocorre ilegalmente criação de gado, é de interesse do Estado e da sociedade.

A decisão judicial cita que a GTA é o documento oficial de sanidade agropecuária, usado para rastrear o rebanho bovino e garantir a saúde animal, mas acrescenta que “essa rastreabilidade também possui relevância ambiental, notadamente por possibilitar a identificação do local de produção de carne animal, a fim de detectar se a atividade econômica estaria sendo desenvolvida em área ilicitamente desmatada ou mesmo embargada por órgãos ambientais”.

Segundo o juiz, a GTA é instrumento de política agropecuária com dimensão ambiental e “há inequívoca obrigação de publicar informações que possuam dimensão ambiental, sobretudo quando sejam úteis à fiscalização estatal ou social do uso de áreas ilicitamente desmatadas para atividade econômica”.

A decisão cita ainda que o descumprimento “sistemático e insistente” das sanções administrativas impostas pelos órgãos ambientais passa a sensação de que a transgressão ambiental compensa, e por isso é necessário combatê-la mais fortemente.

“A divulgação de informações pretendida pelo MPF possibilitará à sociedade civil a fiscalização da origem da carne animal. A ausência da transparência ambiental favorece a continuidade de práticas danosas ao meio ambiente e agrava ainda mais o dano ambiental, na medida em que a utilização econômica de áreas ilicitamente desmatadas, inegavelmente, provocará a continuidade da supressão vegetal ilícita em virtude dos elevados lucros obtidos”, diz a decisão.

Procurado, o Indea-MT disse que “por se tratar de dados sensíveis, foi ingressado recurso de agravo com intuito de suspender a decisão, que será analisada pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região”.

Fonte: Globo Rural